A Conexão entre Futebol, Região e Identidade

Um clube representa não apenas a sua equipa, mas também a história, cultura e valores da comunidade que o apoia. Quando um clube de futebol alcança sucesso, atrai visibilidade para o território, impulsionando o turismo, a economia local e o sentimento de pertença dos cidadãos. Grandes eventos desportivos, estádios icónicos e marcas associadas ao clube ajudam a posicionar a cidade no cenário nacional e internacional

Marketing Territorial e Desporto: A Conexão entre Futebol, Cidade e Identidade

Neste artigo, serão apresentados dois exemplos de clubes em Portugal que souberam explorar essa ligação territorial e implementar estratégias de marketing bem delineadas. O primeiro caso é o do Sporting Clube de Braga, que consolidou a sua identidade como “O clube do Minho”, reforçando a sua presença na região e projetando-se a nível nacional e internacional. O segundo exemplo é o do CD Santa Clara, clube no qual tive o privilégio de estar envolvido na reformulação da sua identidade visual. Este projeto não só fortaleceu a conexão do clube com os Açores, mas também reposicionou a sua imagem dentro e fora da região.

De Arsenal do Minho a Guerreiros do Minho

Até 2008, o SC Braga era conhecido como o “Arsenal do Minho”, uma referência à semelhança do equipamento do clube com o do Arsenal FC, de Londres. Apesar de ser uma alcunha reconhecida, não refletia profundamente a identidade cultural da cidade e da região. Foi nesse contexto que o clube decidiu criar uma campanha que se alinhasse com a história e os valores de Braga e do Minho, resultando na transformação para “Guerreiros do Minho”.

A inspiração veio da Bracara Augusta, uma das mais importantes cidades romanas da Península Ibérica. Braga é marcada por uma rica herança histórica que remonta ao período romano, e muitos dos seus habitantes se identificam com esse legado. Aproveitando essa conexão cultural, o clube criou uma narrativa que integrava os conceitos de história, bravura e identidade regional.

Os Guerreiros do Minho: Um Conceito Vencedor

A escolha do nome “Guerreiros do Minho” foi estratégica e bem fundamentada. O termo “guerreiros” simboliza a determinação e resiliência características das equipas do SC Braga, reconhecidas por enfrentarem adversários de igual para igual, independentemente das dificuldades. Já “Minho” foi uma forma de incluir toda a região, reforçando o posicionamento do clube como um representante regional e não apenas local.

A campanha não se limitou ao slogan. Ela incorporou elementos visuais e comunicativos que remetiam ao período romano, incluindo referências a gládios, armaduras e símbolos históricos. Isso criou um universo temático forte e facilmente reconhecível, que engajou tanto os adeptos como a população em geral.

Impacto no Sentimento de Pertença e na Projeção Regional

A acompanhar o sucesso desportivo do SC Braga nos últimos 20 anos, a campanha foi uma das mais bem-sucedidas da história do futebol português, não apenas por aumentar o envolvimento dos adeptos, mas também por reforçar o papel do SC Braga como um embaixador da região do Minho. O conceito dos “Guerreiros do Minho” trouxe consigo um sentimento de orgulho regional, unindo os habitantes em torno de uma identidade comum.

Esse tipo de estratégia é um exemplo claro de como o marketing territorial pode promover a coesão social e enraizar um clube na vida da sua comunidade. Para os novos residentes da cidade, o SC Braga tornou-se uma ponte para a integração, ao mesmo tempo que projeta a imagem de Braga e do Minho além-fronteiras.

O sucesso da campanha “Guerreiros do Minho” demonstra como um clube de futebol pode ir além do desporto e transformar-se num símbolo cultural e histórico de uma região. Ao alinhar-se com a identidade territorial, o SC Braga fortaleceu laços internos e projetou o Minho como uma região de força e resiliência. Este caso é um exemplo inspirador de como o marketing territorial, quando bem executado, pode unir comunidades e destacar territórios no mapa global.

Reflexão Pessoal

Como adepto do SC Braga, testemunhei a evolução notável do clube ao longo das últimas décadas. No início dos anos 90, o fosso entre os clubes considerados “grandes” e os restantes era imenso, não apenas em termos desportivos, mas também no campo do marketing e do design. Lembro-me de assistir aos jogos do Braga no Estádio da Luz nos anos 90 e sentir a diferença ao ver o pequeno autocarro do clube, com uma decoração simples, ao lado do luxuoso autocarro do SL Benfica.

Hoje, o cenário é diferente. O SC Braga, através de estratégias como a campanha “Guerreiros do Minho”, conseguiu estabelecer-se como uma referência de identidade regional e força desportiva. Essa transformação é um testemunho do poder do marketing territorial aliado a uma visão estratégica.

O novo emblema do CD Santa Clara, que desenvolvi em 2024, é um exemplo prático de como um símbolo visual pode reforçar a ligação entre o clube e a região dos Açores.

Quando tive a oportunidade de participar no concurso para o nova identidade visual do CD Santa Clara, senti que minha experiência e paixão pelo futebol e marketing poderiam ser traduzidas em algo impactante. A ligação emocional que tenho com os Açores ajudou a moldar uma proposta que acabou sendo vencedora entre mais de 140 candidaturas. Este momento foi um marco na minha trajetória profissional e pessoal, pois permitiu contribuir para a consolidação da identidade visual do maior clube desportivo açoriano.

O CD Santa Clara, com o slogan “Bravos Açorianos”, está a desenvolver um trabalho sólido de marketing territorial, unindo toda a região dos Açores em torno do clube. Essa estratégia, que procura criar uma identidade única e independente, é fundamental para escapar das comparações com o SL Benfica (o CD Santa Clara foi uma filial do Benfica e utilizou um símbolo semelhante durante 70 anos), e fortalecer a relação do clube com a sua comunidade.

O novo emblema, alinhado a essa visão, representa mais do que uma atualização visual: é um símbolo de resiliência e de conexão com a rica cultura e história dos Açores. Com a continuidade deste trabalho estratégico, acredito que o Santa Clara colherá os frutos desse esforço a médio e longo prazo, consolidando-se não apenas como uma força desportiva nacional, mas também como um embaixador cultural da região.

A jornada do SC Braga e do CD Santa Clara reflete como o futebol, quando bem gerido, pode ir muito além das quatro linhas, tornando-se uma ferramenta de união e orgulho coletivo para os territórios que representam.


O futebol transcende a esfera desportiva. É uma paixão coletiva que pode unir comunidades, atrair investimentos e promover destinos. Para territórios que procuram afirmar-se num mercado global, este é um jogo que vale a pena jogar – e ganhar.

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